As décadas de 1980 e 1990 foram um período doloroso para o Brasil. O país enfrentou inflação descontrolada, recessão econômica, aumento do desemprego e agravamento da fome. Era preciso reagir com urgência para proteger especialmente as pessoas mais vulneráveis. Foi dessa indignação que nasceu o movimento de empresários que mudaria a história brasileira: a criação do primeiro Banco de Alimentos do país, o Banco de Alimentos do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, lançado oficialmente em 6 de dezembro de 2000 e que, ao completar 25 anos, alcança a marca de 100 milhões de quilos de alimentos distribuídos a quem mais precisa.
À frente desse movimento esteve o industrial Jorge Luiz Buneder, presidente da Stemac Grupos Geradores e então diretor do Sistema FIERGS/CIERGS, que assumia a coordenação do Conselho de Responsabilidade Social e Cidadania da casa da indústria gaúcha. Buneder apresentou a proposta e encontrou apoio imediato do então presidente da FIERGS, Francisco Renan Oronoz Proença. Assim, a iniciativa passou a contar com o suporte de uma das maiores federações industriais do país.
A construção desse projeto, que revolucionaria o modelo de responsabilidade social no Brasil, ganhou a adesão de líderes e instituições fundamentais: Associação de Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE), Associação Gaúcha de Supermercados (AGAS), Associação Leopoldina Juvenil, Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS), Fundação dos Rotarianos de Porto Alegre, Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho (FMSS), Lions Club International, Parceiros Voluntários, Rotary International, Serviço Social da Indústria do Rio Grande do Sul (SESI-RS), Sindicato das Empresas de Transporte de Carga e Logística no Estado do RS (SETCERGS), Sindicato das Indústrias da Alimentação do Estado do RS (SIA), Sindicato de Hospedagem e Alimentação de Porto Alegre e Região (SINDHA), Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) e agência WMcCANN-Ericsson. Foi a união dessas forças que permitiu transformar uma ideia urgente em uma ação concreta.
O Banco de Alimentos do RS – Porto Alegre chega aos 25 anos com sua missão renovada a cada ano, ciente de um propósito simples, porém gigantesco: combater a fome com eficiência, sensibilidade e união. À frente da instituição está Paulo Renê Bernhard, seu presidente, que desde antes mesmo da criação do Banco já atuava de forma decisiva para que essa iniciativa se tornasse realidade. Ao longo dessa caminhada, cada doação e cada mão estendida ajudaram a construir uma trajetória que emociona, inspira e transforma vidas, consolidando um modelo de referência em responsabilidade social e gestão. Ao longo desse período, ao menos 13 países visitaram o Banco de Alimentos, alguns deles se repetiram em diferentes ocasiões.
Além disso, a instituição esteve à frente de importantes movimentos de combate à fome e ao desperdício, como a mobilização pela legalização da doação de excedentes das cozinhas industriais — uma conquista que ampliou a capacidade de reaproveitamento seguro de alimentos e fortaleceu políticas públicas voltadas à segurança alimentar.
Expansão
A experiência bem-sucedida do Banco de Alimentos foi ampliada para outras áreas e setores da economia gaúcha com a criação, em dezembro de 2003, da Fundação Gaúcha dos Bancos Sociais (FGBS) da FIERGS, instituída pelo Conselho de Cidadania da Federação. Sua missão é articular entidades, empresas, empresários e sociedade civil no fortalecimento do terceiro setor, com foco no combate à miséria, à fome e à violência.
A Fundação atua no desenvolvimento de projetos de mobilização e na ampliação de ações sociais, buscando promover a inserção e a melhoria da qualidade de vida de comunidades gaúchas, especialmente em áreas menos favorecidas, combatendo principalmente o desperdício. Muito antes de o termo ESG ganhar força no mundo corporativo, a FGBS já colocava em prática seus princípios — ambientais, sociais e de governança — ao estruturar ações sustentáveis, promover impacto social positivo e garantir transparência e responsabilidade em seus processos. Hoje, abriga 13 Bancos Sociais voltados a diferentes demandas: Alimentos, Computadores, Gestão e Sustentabilidade, Livros, Materiais de Construção, Mobiliário, Órgãos e Transplantes, Projetos Comunitários, Refeições Coletivas, Resíduos, Tecido Humano – Pele, Vestuários e Voluntários.
A maioria dessas iniciativas está instalada em um complexo de 10 mil metros quadrados no bairro Sarandi, em Porto Alegre. Apenas o Banco de Órgãos e Transplantes e o Banco de Tecidos Humanos – Pele funcionam no Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.
Em 2007, a experiência do Banco de Alimentos de Porto Alegre deu origem à Rede de Bancos de Alimentos do RS, criada para padronizar e alinhar práticas, garantindo o cumprimento da legislação e o respeito às normas de Segurança Alimentar.
Hoje, a Rede reúne 25 bancos de alimentos associados, presentes em 31 cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná: Alegrete, Alvorada, Bagé, Cachoeirinha, Camaquã, Canoas, Capão da Canoa, Caxias do Sul, Cruz Alta, Encruzilhada do Sul, Gravataí, Guaíba, Pelotas, Porto Alegre, Região do Calçado (Novo Hamburgo, Estância Velha, Sapiranga e Campo Bom), Rio Grande, Santa Maria, Tramandaí, Torres, Uruguaiana, Vale do Sinos (Portão, Sapucaia, São Leopoldo e Esteio), Venâncio Aires e Viamão, além de Florianópolis (SC) e Curitiba (PR).
União de forças
Há 25 anos, o Banco de Alimentos do Rio Grande do Sul reúne pessoas, empresas, instituições e voluntários em uma grande corrente de solidariedade, sustentada por uma convicção: somente a cooperação entre diferentes setores pode gerar respostas duradouras para problemas estruturais como a fome. A fome é diária — e, por isso, essa missão nunca pode esperar.
Comprometido com uma visão de saúde integral, o Banco de Alimentos dedica parte essencial de sua missão à promoção da segurança alimentar e nutricional. Essa atuação vai muito além da doação de alimentos: além de distribuir itens nutritivos e adequados às necessidades das entidades atendidas, a instituição executa seis projetos sociais de Nutrição e Saúde, beneficiando especialmente crianças e idosos. São iniciativas que estimulam escolhas mais saudáveis, fortalecem hábitos conscientes e asseguram não apenas saciedade, mas nutrição verdadeira — um passo fundamental para romper o ciclo da fome e do adoecimento.
Todos os dias, o Banco de Alimentos conta com a dedicação de parceiros fundamentais: doadores e voluntários que oferecem seu tempo e seu compromisso em torno de um propósito comum — construir uma sociedade mais justa e igualitária, enfrentando aquele que sempre foi o maior flagelo da humanidade: a fome.
Chegar aos 25 anos é, ao mesmo tempo, um motivo de orgulho e de reflexão. Orgulho pela rede de solidariedade que se consolidou; reflexão porque, se o Banco de Alimentos existe, é justamente porque a fome ainda persiste. Não há o que comemorar enquanto vidas seguem marcadas pela insegurança alimentar. Há, sim, responsabilidade — e um compromisso renovado diariamente: seguir adiante com ainda mais determinação.